sábado, 17 de novembro de 2018
Para ficar perfeita uma parede azul exige muitas demãos de tinta, mais ainda se for rugosa. Cobrir de forma homogénea uma parede rugosa e porosa, uma parede que chupa a tinta, exige força e acuidade visual, persistência, bolhas abaixo dos dedos, onde chega o polegar, escaldão nos ombros, se for Verão. Uma parede rugosa é um mapa topográfico, uma maqueta de mundo que pode ferir, se nos escapar a mão. Exige distância. Não falta, de longe, quem veja manchas, diferenças no tom, imperfeições. E proximidade. Para cobrir cada vertente, cada abismo, cada cume, cada vale, depressão ou cavidade.
Para ficar perfeita uma parede azul exige que cocemos o nariz com as mãos sujas de tinta, que rocemos uma coxa na tinta fresca quando nos levantamos para descansar os joelhos. Que nos espreguicemos, longe, com os braços em conta-gotas, antes de nos encavalitarmos no muro para chegar os sítios mais altos. Pingos de azul na cara, soprar os cabelos do rosto, à falta de vento, moldar os pés nus às telhas quentes do sol, barro com barro. Para ficar perfeita uma parede azul exige minúcia de joalheiro, mas também gestos largos e grosseiros. Água, de tempos a tempos, e uma cadeira de plástico por onde trepar e onde possamos regressar.
Sónia Oliveira
sexta-feira, 16 de novembro de 2018
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«Ai a dor que eu já sinto por não te ter aqui
Só mais um doce em troca do azedo que vivi
Só mais um copo para matar o que senti»
- Excerto de Assobio Bêbado, Flávio Torres
Chegas a casa cansada, depois de um dia cheio de stress. Um banho quente, dois copos de vinho depois, e está o caldo entornado
#memóriasantigas
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