domingo, 31 de dezembro de 2017

No hábito de te encontrar preso nas palavras
tento fixar-te em folhas de papel
aí não invento sorrisos
fixo palavras nas linhas,
onde pouco a pouco,
a noite cai
Atravesso-a numa caligrafia manchada pela inocência
escrevo letras redondas, onde és uma sombra
na cor que escolho para as sílabas
e quando as palavras se gastam
ossificam-se em lágrimas secas
Em busca de palavras perdidas
na humidade dos olhos
confundem-se metáforas barrocas
onde o teu nome amanhece abafado
O contorno das sílabas sabe a pele em horas de imitação
onde os dias se devoram em letras invertidas
e palavras nuas, da cor da tinta, respiram sonolentas
São paisagens de vozes escritas
alimentam-se da luz entre a tinta e os dedos
Afinal o perfil do silêncio é apenas uma longa palavra por escrever

Maria Lolita Sousa


#dizem_que_não_têm_sono_e_querem_jr_ver_o_fogo_de_artifício
#2017_22h)
Que quer ainda esse pássaro
tão atento ao silêncio
fulvo da cintura?
Os olhos -
quem foi que fez a casa
em tão frágil azul?
São assim os meus dias,
ardem lábio a lábio
com o vento nos álamos.

(Eugénio de Andrade)
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Procura-se companheira/o
para relacionamento poético sério.
Apenas se exige que saiba dizer
que o surrealismo é coisa para
ter morrido no século XX.

David Teles Pereira.

Quando chegaste anunciavas-te como o melhor ano do ano, e é verdade que vinhas rotulado como o melhor de todos, com prémios de fotogenia e de simpatia nos concursos de San Remo e de Vancouver, de que alguns - poucos - prontamente desconfiaram.

Às primeiras andanças da elíptica já todos sentíamos que o odor do teu perfume era afinal Old Spice e que lias Chagas Freitas às escondidas na casa-de-banho. Daí, até descobrirmos que eras batidinho nas caixas de comentários do Correio da Manhã, foi um tirinho.

Não precisavas disso, 2017! Não precisavas de andar a espalhar a tua vida social de copos com os artistas, nem essa presunção de que irias trazer contigo a Madonna. Estamos um bocado cansados desse pedantismo pá!

Só queríamos um ano justo, tipo XS, um ano justíssimo para os que precisam e para aqueles que se esforçam. Um ano que não se preocupasse em limpar o suor do rosto, que olhasse nos olhos, rua-a-rua, café-a-café, feira-a-feira, riso-a-riso, mão-a-mão. Um ano de consolação. Não precisavas ser histórico ou da sorte, bastava-nos que fosses sincero e honesto.

Ano que é ano deixa as recordações simples de um abraço, de uma mão que ajuda, de um contemplar das Perséiades a rasgar o céu estrelado num acampamento. Tivesses sabido perdoar mais vezes e estaríamos um pouco mais contentes.

Um ano dos verdadeiros acaricia as rugas dos mais velhos enquanto protege as crianças, e deixa sempre um bocadinho de céu para nos aconchegarmos. Os verdadeiros chegam ao fim cansados, de roupa suja e desbotada. Esses sim, são os anos!
Quando são assim somos mais gratos, mais nós. Melhores.

Podes partir agora, 2017!

Precisamos de um ano que exista para além dos areópagos, dos templos, das cortes e dos avanços tecnológicos. Um ano mundial que chegue antes do tempo e que traga com ele um abraço um pouco mais demorado porque mais sentido, que segure na mão e que fique para escutar.

Vem depressa, 2018!
Dele já se diz à boca fechada que é filho bastardo do sonho.

Paulo Marques

Feliz Ano Novo!