sexta-feira, 18 de janeiro de 2019

Mata Furry 🐩🍸💘👯
Dez anos depois Dez anos depois continuo a esfregar a lâmpada mágica, mas na tentativa de expurgar este génio de enxofre que tomou conta do meu corpo, há nove, reduzindo-me a um chumbinho perdido nos meandros de uma AK-47 com silenciador. Não acredito em desejos. Já não vejo o meu reflexo na lâmpada mágica, como há dez anos via. Há dez anos achava que. E um ano depois. Um ano depois deixei de achar, passei a perder. Perdi coisas, perdi pessoas, perdi-me a mim. E o que não perdia perdia-se sempre num labirinto qualquer que eu fazia questão de construir com as minhas próprias mãos de minotauro, de animal por sacrificar. Continuo a erguer labirintos e a perder-me neles. Um pouco menos, mas ainda demasiadas vezes para que possa ser salva. Continuo a coser-me com linha de preguiçosa, um fio de Ariadne demasiado comprido que se enleia, enrodilha e parte. Que os pássaros comem, que não tem caminho. Continuo em círculos dentro do meu corpo-jaula sem janela. Sónia Oliveira
A memória, sem o corpo, não é ascensão nem recomeço, e, sem ela, o corpo é incapaz de nudez e de amor. Manuel António Pina
Um raio de luz lançou toda a doçura num sono. Quem o dormiu antes do tempo? Ingeborg Bachmann
Agora, eu sei: do amor me interessa apenas o não-saber, deixar o corpo fora da mente, em descomando absoluto. Mulher apenas na aparência. Debaixo do gesto: bicho, fera, lava. Mia Couto