quinta-feira, 15 de março de 2018
A arte de perder não é difícil de dominar;
há tanta coisa que parece conter em si a intenção
de vir a ser perdida que a sua perda não é desastre algum.
Perde qualquer coisa todos os dias. Aceita o nervosismo
pelas chaves perdidas, pelas horas mal gastas.
A arte de perder não é difícil de dominar.
Depois experimenta perder mais longe, perder mais depressa:
lugares e nomes e o destino para onde tencionavas
viajar. Nada disso provocará desastre algum.
Eu perdi o relógio da minha mãe. E, vê bem, foram-se-me as últimas
ou as penúltimas casas que mais amei
A arte de perder não é difícil de dominar.
Perdi duas cidades, ambas cidades amadas. E alguns reinos
mais vastos que foram meus, dois rios, um continente.
Tenho saudades deles mas perdê-los não foi um desastre.
Mesmo perder-te (o tom de voz irónico, um gesto que
amo) é algo que não devo omitir. É evidente
que a arte de perder não é difícil de dominar
embora possa parecer (Escreve-o!) um desastre.
[poema de Elisabeth Bishop, tradução Carlos Vaz Marques]
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